REFLEXÕES SOBRE ANDAR DE MOTOCICLETA
Uns dias atrás
fiquei sabendo de um acidente de moto envolvendo um colega. Não somos amigos,
mas apenas colegas de duas rodas.
Isto me deixou
apreensivo, pois como sempre, envolve alta velocidade em área urbana. Em todos
estes acidentes, os colegas e amigos de duas rodas tentam justificar como a
culpa de um motorista imprudente que parou repentinamente, um motorista que
mudou de faixa sem sinalizar, um motorista que avançou o sinal vermelho, um
motorista que estava bêbado, um motorista que atropelou o motociclista, etc. Ou seja, é
tudo culpa dos motoristas. Os motoristas com seus veículos gigantes, ocupando
mais espaços que o necessário, lentos nas manobras, lentos no raciocínio,
enfim, tudo culpa dos motoristas. Será?
Andando de
moto a um bom tempo, vou colocar minhas reflexões sobre alguns efeitos que moldam os tipos de motociclistas que encontrei pelos caminhos da vida.
EFEITO TESTOSTERONA
Um pessoa
pacata, tímida, acha que se comprar uma moto, vai se transformar num super-macho
alfa. Então, escolhe a maior moto que pode comprar. Dizem que o tamanho da moto
escolhida é inversamente proporcional ao tamanho do membro reprodutor do comprador. Eu
prefiro acreditar que o tamanho da moto é diretamente proporcional ao saldo positivo da conta bancária
do comprador. Neste primeiro momento, é pura ostentação. Parece que vai poder
transar com todas as mulheres do mundo. Logo descobre que quem gosta de motos são
homens. E, descobre que para ser respeitado entre dos homens é preciso também
andar rápido. Aí que mora o perigo. Pois, quando se está rápido é preciso ter
alguma noção de física: energia cinética. É uma daquelas coisas que a pessoa só
dá conta quando é parado bruscamente, infelizmente com trágicas conseqüências
EFEITO BANDO
É aquela
situação em que um sujeito faz coisas que sozinho não faria jamais. O grupo
anda rápido, então ele anda rápido pois não quer ser alvo de bullying, ser o
cagão da turma. Então anda rápido demais, faz curvas esfregando a saboneteira
no asfalto, empina a moto nas trocas de marchas. E um dia, acontece o impensável:
deixa o bando por força maior.
EFEITO PAVÃO
Compra
capacetes, macacão, luvas, protetores cervicais e botas seguindo tendências e
grifes, achando que quando mais caros, mais proteção oferecem. E com isso,
tendem a correr mais ou se arriscar mais, quando deveria ser o inverso: por ser
caro, andar mais devagar para não cair e estragar o equipamento.
EFEITO SUPER-HOMEM
Mais rápido
que uma bala, mais forte que um trem. Por ser um veículo que acelera muito mais
rápido que qualquer veículo produzido em massa, uma motociclita de 600 cc ou
superior dá a falsa sensação de superioridade. Quando no fundo é uma coisa
muito frágil, com mínima proteção para seu piloto e/ou passageiro. Por esta razão,
há empresas que literalmente proíbem seus colaboradores a terem motocicletas
que qualquer cilindrada. Quem pilota uma moto acima de 120 km/h flerta com a
morte. Não vai adiantar estar usando o capacete de fibra de carbono e kevlar, o
macacão de couro bovino italiano, as luvas com proteções com compósitos da era
espacial, botas com sapatilhas ultramodernas, se bater a esta velocidade. Se não
morrer, vai parar num hospital com lesões graves.
Penso que a
culpa não é só dos motociclistas. Os fabricante de motocicletas têm suas parcelas de culpa. Exceto uma, todas as marcas conhecidas procuram a cada ano lançar
motos com 2 a 4 cavalos a mais que o ano
anterior, e com isso andar de 10
a 20
km/h a mais. Hoje, é comum motos 600 cc ultrapassar 230 km/h . As motos de
1.000 cc chegam fácil a 260 km/h , podendo
ultrapassar 300 km/h cv nos modelos superesportivas. Tudo a um custo
bem inferior a um carro de mesmo desempenho. Ou seja, colocam no mercado foguetes a um custo que uma
parte significativa dos motociclistas podem adquirir, sem necessidade de um “brevê”
especial para pilotá-los nas avenidas e nas estradas.
Quando uma fábrica
lançou recentemente um modelo 500 cc e 700 cc que mal chega a 180 km/h , o que mais se
ouviu foi de que eram modelos chochos, lerdas, fraquinhas, etc. Nem se
preocuparam que elas fazem 30
km/litro ou mais. É como se percorrer 50 metros em um segundo (180 km/h ) fosse coisa de
tartaruga. Acredito que a maioria dos motoristas nem chegaram a 140 km/h em seus carros,
por puro medo, alguns por prudência. Mas, esta velocidade para uma motociclista
com uma 600 cc é mínima. O ideal é 180 ou 200 km/h , dando piques de 240 km/h !
É preciso
repensar o prazer de andar de motocicleta. Com o passar do tempo, o prazer de
sentir o vento no rosto, foi substituído pela adrenalina de estar a 230 km/h ou chegar a
ultrapassar 300 km/h ,
tudo filmado para postar no YouTube como se fosse a coisa mais importante a se
fazer, arriscando a maior dádiva de Deus, a vida!